João Carlos Marchesan, Presidente do Conselho de Administração da ABIMAQ
O cenário para os próximos anos é promissor. Essa constatação está firmada no impulso percebido por diversos segmentos da economia nacional no segundo semestre de 2018, mais especificamente entre agosto e novembro. Mesmo ainda incipiente, o movimento ascendente estimula o empresariado, principalmente porque há cinco anos o setor industrial amarga queda da atividade produtiva, com muitas empresas mantendo apenas 50% de sua produção que, em grande parte, vem sendo destinada à exportação.
Em números, isso significa que as empresas de máquinas e equipamentos, em 2012, faturaram mais de R$ 120 bilhões, dos quais US$ 11 bilhões (ou R$ 21 bilhões) foram exportados. Em 2017, no entanto, o quadro mudou: o faturamento caiu para cerca de R$ 70 bilhões, dos quais R$ 40 bilhões se destinaram ao mercado interno e US$ 9 bilhões (ou R$ 30 bilhões) à exportação.
Representando a atividade de produção de máquinas e equipamentos, que soma ao redor de 7.500 empresas, a ABIMAQ segue otimista, embalada pelos resultados de 2018, que somam receitas totais de R$ 78,1 bilhões – 7% acima do mesmo período do ano anterior –, com R$ 37 bilhões originados nas vendas ao mercado internacional, volume 15,6 % superior ao de 2017, considerando valores FOB em reais e a variação do câmbio de acordo com a média mensal.
Nesta entrevista, João Carlos Marchesan, presidente do Conselho de Administração da ABIMAQ, faz um resumo de 2018 e fala das expectativas para este ano.
Boa leitura!
Máquinas & Equipamentos – Como definir o ano de 2018?
João Carlos Marchesan – Foi um ano de inversão de tendências. 2018 foi o primeiro ano em cinco em que o setor cresceu sobre o período anterior. Foram 7% de evolução sobre um faturamento que soma queda de 40% em 60 meses. É importante recordar que estamos vindo de anos desfavoráveis que promoverem a redução, para cerca da metade, do peso da indústria de transformação no PIB, uma perda de participação dos manufaturados nos mercados externos, a reprimarização da economia e uma crescente dependência de commodities. Uma indústria menor e menos diversificada aumenta nossa dependência externa de bens e serviços avançados, reduz nossa soberania e enfraquece o papel do Brasil na economia e política mundiais. 2018 sinaliza com um novo ponto de início, que se desenvolverá em 2019 e nos próximos anos, um ciclo que, esperamos, traga-nos os melhores anos de nossas vidas, com muita esperança e trabalho.
“Estimamos que o crescimento deve ser próximo ao registrado em 2018, fruto de substituição de máquinas antigas por novas, com parte originada pela expansão de algumas plantas”.
M&E – Quais os pontos principais do último ano com relação aos resultados do setor representado pela ABIMAQ?
JCM – Analisando os resultados, há características a serem observadas porque influenciaram o comportamento em 2018: as exportações aumentaram 14% – se considerarmos US$ FOB, ou em 15,6%, em R$ FOB –, enquanto o mercado interno cresceu apenas 0,3%. Alguns setores, inclusive, registraram resultados mais expressivos, como o de máquinas e implementos agrícolas, que apresentou valores 12% maiores quando comparados a 2017, em função da excelente rentabilidade dos agricultores, principalmente na soja e no algodão, bem como câmbio favorável e maior disponibilidade regular de recursos para investimento durante todo o período. Este segmento, especificamente, trabalha sobre a perspectiva do aumento de 10% nas vendas em 2019.
Os investimentos produtivos, medidos pelo consumo aparente de máquinas e equipamentos (produção – exportação + importação) após quedas consecutivas nos últimos quatro anos, registrou, em 2018 crescimento de 13,4%. Esse é um bom indicativo de expectativas de aumento mais intenso do consumo. Já o Nível de Utilização da Capacidade Instalada (NUCI) do setor, durante o ano de 2018, manteve tendência de recuperação, mas, ainda assim, encontra-se em patamar bastante baixo (75%), mostrando que há espaço para expansão das atividades com a atual estrutura produtiva, a exemplo do que ocorre nos demais setores da indústria de transformação. Mesmo com a carteira de pedidos estabilizada em 2 meses, a expectativa é de que, tão logo o setor de infraestrutura volte a investir, retornaremos ao patamar histórico.
M&E – A ociosidade se reflete no emprego. Quais os níveis atuais?
JCM – Em meados de 2013, começamos a registrar encolhimento de postos de trabalho na indústria de máquinas e equipamentos. À época, o setor empregava quase 380 mil pessoas e, em 2017, o número tinha encolhido para 291 mil pessoas. O ano passado também foi marcado pela retomada do processo de contratações. Os valores ainda são pouco expressivos, mas positivos: cerca de 10 mil pessoas retornaram ou ingressaram nas indústrias do setor de bens de capital mecânico. Nossa expectativa é a de que esse movimento ascendente não seja interrompido ao longo de 2019.
“Há sinalizações de que o governo deverá seguir agenda reformista, com privatizações e concessões. Por parte do empresariado, notamos movimentos importantes”.
M&E – Estão sendo usuais os comentários sobre o impacto positivo das eleições na elevação do otimismo dos diversos setores da economia, que confiam em um período menos turbulento economicamente, pari passu com o resultado das urnas. Como o setor de máquinas e equipamentos será impactado pelo novo governo?
JCM – Caso o governo eleito dê encaminhamento aos projetos necessários e que foram prometidos durante a campanha, como a reforma tributária e previdência, as grandes empresas vão acreditar no mercado e vão investir, afinal, o investimento é a primeira vítima em qualquer crise. Se forem destravados os investimento em infraestrutura, será gerado emprego, mesmo considerando-se o tempo de maturação dos projetos. O importante é que, em qualquer dos quadros, o otimismo permanece e se estende a 2020.
A agenda neoliberal proposta no governo Bolsonaro, de forma simplificada, funda-se em duas diretivas principais: forte aumento da concorrência, via abertura comercial e financeira, e desregulamentação ao lado de sensível redução do tamanho do Estado, com privatizações e limitação de sua capacidade de gastar, com o uso de instrumentos como a Lei do Teto. Mas isso não é suficiente por si só. É preciso que haja crédito a custos assemelhados aos de nossos concorrentes, sejam implementadas as reformas que reduzam a carga sobre a indústria e o custo de administrar os impostos e desonere completamente investimentos e exportações, além de reduzir a volatilidade do câmbio e dos fluxos de capitais especulativos.
Se o governo trilhar este caminho, há fortes razões para esperar não somente uma retomada sustentada do crescimento econômico, mas o fortalecimento da indústria com a construção de um parque industrial moderno, sofisticado e diversificado capaz de avançar em direção ao novo paradigma da manufatura avançada.
M&E – Quais as expectativas para 2019?
JCM – Acreditamos na tão esperada desregulamentação como promotora da melhoria do ambiente de negócios, do aumento da segurança jurídica e da crescente concorrência, fatores essenciais para o crescimento em um regime de mercado. Precisamos, contudo, que esta concorrência seja saudável e estabeleça a isonomia nas condições de competição, tanto no mercado interno, quanto com relação a nossos concorrentes externos.
Essa mudança de clima – caso se concretize – fortalecerá o que vem sendo sinalizado: em 2019, as exportação não devem puxar o setor para cima, porque o mundo deve crescer menos. Isso tem relação, inclusive, com as previsões do FMI de crescimento entre 0,2% e 0,3% sobre o ano anterior. Em percentual, parece pouco, mas a base é o PIB mundial, que se situa ao redor de US$ 80 trilhões.
Desse modo, o crescimento da atividade produtiva no Brasil virá exclusivamente do mercado interno, apesar dos problemas ainda existentes, como endividamento das empresas não-financeiras de capital aberto ao redor de 50%, e das PME, que estão mais endividadas e arcam com custos de capital mais pesados. Por esses motivos, estimamos que o crescimento deve ser próximo ao registrado em 2018, fruto de substituição de máquinas antigas por novas, com parte pequena originada pela expansão de algumas plantas.
“O Brasil que está, hoje, entre as dez maiores economias mundiais e estará entre as primeiras cinco, em 2050. Para isso, contudo, é essencial ter uma indústria forte e competitiva”.
M&E – Com relação a investimentos, quais as perspectivas?
JCM – Há sinalizações do governo com relação a seguir uma agenda reformista, com nova rodada de concessões de infraestrutura e privatizações, que movimentará o mercado. Também notamos, por parte do empresariado, movimentos importantes. Levantamento recente do Departamento de Economia e Estatística, da ABIMAQ indica que os fabricantes preveem investir mais de R$ 2,7 bilhões em 2019, alta 30,1%, em relação ao volume investido em 2018, quando à relação entre investimentos sobre receita líquida de vendas, não foram ultrapassados os 3,7%, valores muito aquém da época entre 2010 e 2013, quando foi de 9,3%.
Essa pesquisa ainda revelou que as Micro, Pequenas e Médias empresas estão mais dispostas a investir em 2019, com previsão superior aos investimentos realizados em 2018, entre 48,7% e 50,3%, respectivamente. Já por parte das grandes empresas, essa disposição é menor, na casa dos 17,9%. Os investimentos devem ganhar mais folego somente no segundo semestre, quando as reformas forem aprovadas e o nível de ociosidade reduzido, que hoje se encontra em 25%.
Dos investimentos esperados em 2019, 35,5% devem ser destinados para modernização tecnológica, 30,5% na reposição de máquinas depreciadas, 24% na ampliação da capacidade industrial e 10% em outras áreas. O que deverá impulsionar os investimentos é a nova rodada de concessões de setores de infraestrutura.
M&E – A ABIMAQ vem reivindicando uma agenda de competitividade. Com o novo governo, a agenda sofreu alguma alteração?
JCM – Quando falamos nessa agenda, é fundamental a compreensão de que não queremos favores. Nossa meta é ter condições de competir, tanto no mercado interno, quanto no internacional. Os pleitos continuam os mesmos, afinal, ainda não foram equacionados: câmbio relativamente estável e competitivo, inflação controlada, redução da insegurança jurídica, simplificar e diminuir a carga tributária, ter mais disponibilidade de crédito – inclusive para exportação – e facilitar o acesso a juros de mercado menores que o retorno da atividade das empresas. Se isso for feito, voltaremos a crescer decentemente já neste ano
O Brasil que está, hoje, entre as dez maiores economias mundiais e estará entre as primeiras cinco, em 2050, segundo projeções de consultorias internacionais, poderá ser um ator importante nas relações internacionais. Para isso, contudo, é essencial ter uma indústria forte e competitiva que garanta nossas seguranças alimentar, energética e militar, num mundo que deverá ser multipolar e mais complicado.