Andando em círculos

Sancionada pelo presidente Jair Bolsonaro em 15 de julho e publicada no dia seguinte no Diário Oficial da União, passando a vigorar de imediato, a nova lei 14.026/2020 é fruto do PL 4.162/2019, aprovado pelo Senado Nacional em 24 de junho de 2020. Popularmente, corresponde ao Novo Marco Regulatório de Saneamento Básico.

A sanção presidencial veio acompanhada de 12 vetos, mas nenhum deles muda o prazo de 2033 como limite para a universalização. Todos os vetos dependem de análise pelo Congresso Nacional, em sessão a ser marcada, cabendo aos parlamentares confirmar os vetos presidenciais ou derrubá-los.

No entanto, tudo poderia ter sido resolvido há mais tempo, afinal, o PL 4.162/2019 baseia-se nas Medidas Provisórias (MP) 844/18 e 868/18, que perderam a validade sem terem sua apreciação completada no Congresso Nacional em 2019. Assim, o governo enviou ao Legislativo um projeto com o mesmo tema.

O texto aprovado no Senado prorrogava o prazo para o fim dos lixões, facilitava a privatização de estatais do setor e extinguia o modelo atual de contrato entre municípios e empresas estaduais de água e esgoto. Pelas regras em vigor, as companhias precisariam obedecer a critérios de prestação e tarifação, mas poderiam atuar sem concorrência. O novo marco transformaria os contratos em vigor em concessões com a empresa privada que vier a assumir a estatal. O texto também tornaria obrigatória a abertura de licitação, envolvendo empresas públicas e privadas.

Conforme retratado no texto final, o objetivo da nova lei é ampliar a presença do setor privado na área de saneamento, hoje controlada por empresas públicas estaduais, que celebram contratos com os municípios (os chamados contratos de programa) para prestar os serviços, geralmente sem licitação. A Lei 14.026/2020 exige licitação para todas as situações, com empresas privadas competindo em igualdade de condições com as estatais. O vencedor assinará um contrato de concessão com o município. O governo alega que a medida vai criar um ambiente de segurança jurídica, impulsionando os investimentos no setor.

Outros pontos importantes do Marco Legal são o reforço da Agência Nacional de Águas (ANA), que passa a ter competência para regular o setor de saneamento no País, a possibilidade de tarifação de outros serviços relacionados ao saneamento, como varrição de rua, a formação de blocos de municípios para contratar os serviços regionalizados de saneamento e o adiamento do fim dos lixões.

Conforme retratado pela Agência Câmara de Notícias, o veto mais relevante envolve o artigo que autorizava os municípios a renovarem, por 30 anos, os contratos em vigor com as companhias de saneamento. A regra beneficiaria até mesmo cidades onde o serviço é prestado hoje sem um contrato formal. Com o veto, os governos locais serão obrigados a realizar licitações para substituir esses contratos.

Outro ponto importante vetado por Bolsonaro envolve dispositivo que facultava aos municípios participar dos blocos. Segundo ele, a Constituição exige que municípios que integram regiões metropolitanas – onde está a maior parte da população – participem da “execução de funções públicas de interesse comum”.

Ainda sobre os blocos, Bolsonaro vetou o dispositivo que determinava à União apoiar, com recursos e assistência técnica, a organização e a formação dos blocos municipais. A justificativa foi de que a obrigação não foi acompanhada de medição do impacto orçamentário e financeiro da medida, em desacordo com a legislação fiscal.

Pelo mesmo motivo foi retirado da lei o dispositivo que autorizava os governos federal e estaduais a apoiar os municípios no encerramento dos lixões.

Também foi vetado o dispositivo que permitia à empresa vencedora da licitação subdelegar mais de 25% do valor do contrato para outras empresas, sem prévia autorização municipal, assim como o artigo que conferia ao Conselho Nacional de Recursos Hídricos (CNRH) a competência para acompanhar a execução do Plano Nacional de Saneamento Básico. A justificativa para o veto foi de que a nova competência não encontra respaldo na legislação em vigor.