Marcio Félix, Secretário de Petróleo, Gás Natural e Biocombustível do Ministério de Minas e Energia
Graduado em Engenharia Eletrônica pela Universidade de Brasília, com especialização em Engenharia do Petróleo pela Universidade Petrobras, e MBA em Gestão Empresarial pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, o engenheiro Márcio Félix assumiu a Secretaria de Petróleo, Gás Natural e Combustíveis Renováveis do Ministério de Minas e Energia (MME) em 2016.
Ao longo de sua carreira profissional, o petróleo domina sua experiência, pois foram mais de 30 anos na Petrobras, onde chegou a e gerente-geral de América do Norte e África na Exploração e Produção Internacional.
Nesta entrevista exclusiva à Máquinas & Equipamentos, Félix discorre sobre a evolução do setor, o Pré-Sal e a entrada de novos atores no mercado, que trazem ganhos expressivos para o País e a atividade produtiva no geral, pois “o desenvolvimento da indústria petrolífera influi sobremaneira no desenvolvimento econômico e tecnológico e na geração de emprego e renda internamente”.
Entre as evoluções previstas nessa atividade, o secretário citou debate em âmbito governamental de possíveis mecanismos de incentivo ao desenvolvimento da indústria fornecedora local, como criação de bonificações para os operadores que adquirissem localmente bens para utilização em suas atividades do Exterior. Também falou sobre planos com o RenovaBio, que envolvem, por exemplo, o reconhecimento do papel desses combustíveis nacionais na redução das emissões de Carbono na atmosfera. “Em janeiro de 2020, daremos início a esse novo programa”, garantiu, informando, também que, a meta é alcançar R$ 1,47 trilhão nos setores de petróleo, gás e biocombustíveis, até 2027.
Confira a íntegra e boa leitura!
Máquinas & Equipamentos – Como o Ministério de Minas e Energia vê a evolução do setor ao longo desses 20 anos?
Márcio Félix – Não existem dúvidas de que a flexibilização do monopólio da União no setor pela Emenda Constitucional nº 9, de 1995, e a consequente aprovação da Lei do nº 9.478, de 1997 (Lei do Petróleo), que instituiu o modelo de concessão para a oferta de áreas petrolíferas, além de criar o Conselho Nacional de Política Energética – CNPE e a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis – ANP, trouxeram grandes avanços para o País, bem como a edição da nova Política de Exploração e Produção de Petróleo e Gás Natural, aprovada pelo CNPE em 2017, propiciaram a atração de investimentos para o setor, além de diversificar o número de operadores e empresas nele atuantes. Todos esses avanços, somados às expressivas reservas do Polígono do Pré-Sal, projetam que o Brasil deverá se tornar o quinto maior produtor mundial de petróleo em curto espaço de tempo. E isso certamente se reverterá em benefícios para toda a sociedade brasileira, por meio da geração de emprego e renda, internamente.
M&E – Quais as principais contribuições da entrada de novos atores no cenário local, reduzindo a participação da Petrobras?
MF – Mesmo em face de toda a expertise da Petrobras na exploração e produção de petróleo e gás natural, feito esse reconhecido internacionalmente por meio dos muitos prêmios conquistados e que a tornaram orgulho nacional, a empresa por si só não seria capaz de arcar com os vultosos investimentos necessários para o desenvolvimento das expressivas reservas descobertas recentemente. Assim, a entrada de novos atores, que num primeiro momento ocorreu em associação com a Petrobras, trouxe o aporte de recursos necessários para o início do desenvolvimento dessas descobertas e agregou sinergia ao desenvolvimento de tecnologias pela Petrobras na produção em águas ultra profundas. Isso resultou em benefícios para todos, tendo em conta o crescimento projetado para o setor.
“Os avanços, somados às expressivas reservas do Pré-Sal, projetam que o Brasil, em breve, será o quinto maior produtor mundial de petróleo”
M&E – Que ganhos foram obtidos nesses 20 anos e quais evoluções ainda são necessárias?
MF – Desde 1999, foram realizadas 15 rodadas de licitações de blocos exploratórios e quatro de campos marginais, sob regime de concessão, além das cinco rodadas com áreas do Pré-Sal, na modalidade de partilha de produção. Como efeito direto dessa ampliação de atores, a União arrecadou somas importantes de bônus de assinatura, além dos royalties compartilhados com os demais entes da Federação. Em decorrência, a indústria de bens e serviços vem sendo desenvolvida, trazendo desenvolvimento e movimentando a economia de todo o País. Atualmente, os esforços concentram-se na conclusão da revisão do Contrato de Cessão Onerosa e na realização do leilão de seus volumes excedentes, o qual deverá ser o maior do planeta. Tudo isso tem trazido importantes retornos ao País.
M&E – Quais os gargalos a serem vencidos?
MF – Inclui-se nesse rol a revitalização das atividades de E&P (exploração e produção) onshore, que passa pela equalização do aproveitamento dos recursos de baixa permeabilidade. Para vencer esses desafios, o Governo tem despendido esforços no sentido de facilitar o diálogo com as partes envolvidas e, ao fim e ao cabo, aprimorar o setor para o bem coletivo.
M&E – Além do Pré-Sal, o Brasil continua contanto com campos offshore e terrestres, além de refinarias. Nesse cenário, aparentemente, há espaço para empresas de portes diversificados. Essa é uma realidade? Como regular um mercado tão diversificado e com características tão específicas e diferenciadas?
MF – No caso do E&P, passo importante foram as diretrizes da Resolução CNPE que aprovou a nova Política do setor em 2017. Por meio dessa, foi possível a instituição da modalidade de Oferta Permanente pela ANP, a redução de royalties para a produção incremental, resultante de novos investimentos nas áreas, e aprovação dos mecanismos para o financiamento do setor com base nas reservas das áreas. Outro ponto ainda que merece destaque nesse contexto foram os aprimoramentos em relação à Política de Conteúdo Local, mais adequada à realidade da indústria fornecedora e que destravou investimentos em muitos projetos por parte da indústria operadora. Destaca-se também que o Brasil, apesar de ser exportador de petróleo, importa combustíveis e produtos petroquímicos na ordem de 500 mil barris por dia e, dessa maneira, identifica-se oportunidade de implementação de novas refinarias no País. Além das refinarias de grande porte, de grande complexidade e alto valor investido, vislumbra-se, também, oportunidade de negócio com a construção de refinarias de baixa capacidade de processamento e, geralmente, de baixa complexidade. Essas minirrefinarias, se implantadas, proporcionarão grande sinergia com os pequenos produtores de petróleo, podendo explorar nichos de mercados específicos petroquímicos e/ou combustíveis.
M&E – Quais as ações previstas pelo MME e como devem impactar o mercado e também a indústria fornecedora para o setor?
MF – O desenvolvimento da indústria petrolífera influi sobremaneira no desenvolvimento econômico e tecnológico e na geração de emprego e renda internamente. Além disso, a arrecadação dos montantes provenientes das participações governamentais (bônus de assinatura, royalties e participações especiais), bem como as receitas provenientes da comercialização do petróleo e gás natural da União, rendem recursos públicos essenciais à saúde e educação e aos cofres públicos de todos os entes da Federação, o que vem sendo alcançado com os aprimoramentos já feitos. Em complemento, encontram-se em discussão, no âmbito do Governo, possíveis mecanismos de incentivo ao desenvolvimento da indústria fornecedora local, que já começou a se beneficiar do aumento do número de atores na exploração e produção. Um deles seria a criação de bonificações para os operadores que adquirissem localmente bens para utilização em suas atividades do Exterior, que poderiam ser utilizados para o cumprimento de parte dos compromissos de conteúdo local de contratos já encerrados, onde a única alternativa que resta seria a aplicação de multas pela ANP. Isso vinha sendo discutido no âmbito do Pedefor e agora, com a nova configuração dos Ministérios que o compunham, deve continuar a partir da reestruturação do Programa.
M&E – Como vêm evoluindo os biocombustíveis e qual o impacto previsto no mercado e na indústria fornecedora?
MF – O Governo está preparando a regulamentação para que no início do ano que vem o RenovaBio, que é a Política Nacional de Biocombustíveis, valorizando a produção de Biocombustíveis Nacional, esteja funcionando. Iremos reconhecer o papel que esses combustíveis nacionais têm na redução das emissões de Carbono na atmosfera. Em janeiro de 2020, daremos início a esse novo programa. A meta já estabelecida é que o setor de transporte com o Renovabio reduza em mais de 600 milhões de toneladas de Carbono na matriz de transporte nos próximos dez anos.
Todos os biocombustíveis (etanol, biodiesel, biogás, bioquerosene de aviação) terão o direito de emitir um Ativo Financeiro que se chama CBIO e será comercializado na bolsa de valores. Quanto mais eficientes e menos emissões mais CBIOs poderão emitir. É uma união entre a produção renovável e o setor de petróleo e gás.
Isso significa um esforço ambiental e reconhecimento da importância do agronegócio na produção de energia. O Renovabio é um instrumento de mercado. Não tem recursos públicos e não tem aumento de tributos. Criaremos um mercado para quem emitir menos Carbono. Essa política criada no MME será responsável por reduzir as emissões, criar mais empregos e renda no campo, valorizar uma riqueza brasileira que são os biocombustíveis e ainda podem baixar o preço para o consumidor. Isso tudo respeitando a expansão do mercado de petróleo e gás.
M&E – Como o perfil da matriz energética brasileira deve evoluir e como isso impactará o petróleo e o gás?
MF – A matriz elétrica brasileira possui cerca de 13.000 MW de usinas termelétricas a gás natural, representando cerca de 8% da capacidade instalada do País. Esta capacidade tende a aumentar ao longo dos próximos anos, considerando, especialmente, o potencial do gás natural, especialmente proveniente do Pré-Sal. O sistema contará com a expansão de, aproximadamente, 5.000 MW de usinas a gás natural até o ano de 2027 para propósitos de atendimento ao balanço energético, fazendo uso de tecnologias em que a elevada eficiência da geração elétrica é uma característica preponderante, portanto, com valores de CVU mais baixos. A indicação é de que o sistema precisará de mais 13.000 MW de oferta, associada à necessidade de complementação de potência, o que representa cerca de 33% da capacidade instalada da expansão indicativa. Serão retirados do sistema aproximadamente 5.000 MW de oferta de usinas a óleos diesel e combustível (atualmente em operação no sistema). Portanto, parte da expansão a gás natural serve para substituir essas usinas a óleo que serão descomissionadas. Além da geração de energia elétrica, é importante considerar a ampliação do mercado das distribuidoras estaduais de gás, além dos mercados industriais e de transporte.
M&E – Em abril, o Brasil participou da OTC Houston, e o sr. fez uma apresentação sobre o mercado de gás natural no Brasil. Qual o balanço que faz dos objetivos da apresentação que envolvia mostrar a atratividade de investimentos para empresas que ainda não atuam no Brasil?
MF – Está em curso a proposição de um conjunto de medidas no âmbito do Novo Mercado de Gás. Trata-se de programa coordenado pelo Ministério de Minas e Energia, desenvolvido em conjunto com o Ministério da Economia, a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) e a Empresa de Pesquisa Energética (EPE) para a formação de um mercado de gás natural aberto, dinâmico e competitivo. As ações estão orientadas pelos pilares de política energética, quais sejam governança, estabilidade regulatória e jurídica e previsibilidade, de modo a alcançar entre os resultados esperados um significativo aumento de investimentos em infraestrutura de escoamento, processamento, transporte e distribuição de gás natural, associado ao aproveitamento do gás do Pré-Sal, da Bacia de Sergipe e Alagoas e de outras descobertas relevantes. Também são esperados o aumento da geração termelétrica a gás e a retomada da competitividade da indústria notadamente dos setores de celulose, cerâmica, fertilizantes, petroquímica, siderurgia, cerâmica, vidro, entre outros. Em termos de investimentos setoriais, espera-se alcançar R$ 1,47 trilhão nos setores de petróleo, gás e biocombustíveis, até 2027.