Entrevista: Inteligência artificial no campo é a 5ª Revolução da Agricultura

Fábio Torres, diretor da Associação Brasileira de Agricultura de Precisão (AsBraAP), nesta entrevista para a revista Máquinas & Equipamentos, fala sobre a presença da inteligência artificial na agropecuária, alinha os gargalos, descreve os ganhos e aponta caminhos para que as tecnologias de precisão e digitais estejam cada vez mais acessíveis aos produtores rurais.
Confira!

M&E – inteligência artificial é uma realidade na agropecuária? Qual a sua importância?
Fábio Torres –
A inteligência artificial (AI) possibilita que as máquinas aprendam com as experiências e, desta forma, ajustem-se a novas entradas de dados, realizando tarefas como seres humanos. A maioria dos exemplos de IA – desde computadores que jogam xadrez até carros autônomos – dependem de deep learning (aprendizado profundo) e do processamento e entendimento da linguagem humana. Com essas tecnologias, os computadores podem ser treinados para cumprirem tarefas específicas ao processar grandes quantidades de dados e reconhecer padrões nesses dados.
A inteligência artificial já chegou sim ao campo. Faz parte da 5ª “revolução” da Agricultura, que é a Agricultura 5.0 ou a Era dos Analytcs.
Os primeiros veículos autônomos circulam nas lavouras com recursos de inteligência artificial. Plantadeiras, tratores, pulverizadores e colhedoras autônomas já mostram suas “caras” nas lavouras. Um exemplo é o pulverizador “Arbus 4000 JAV” da Jacto, presente em alguns dos grandes grupos citrícolas ou florestais, que têm a habilidade de ir aprendendo o que são obstáculos, seres vivos, plantas, e tomar decisões sozinho sobre continuar trabalhando ou parar, de acordo com o que enxerga pela frente.
Armadilhas de pragas “inteligentes” capturam as imagens dos insetos, enviam para a nuvem e o produtor recebe o índice de infestação, imagens das pragas, quantidade e a identificação de qual tipo de praga está presente em sua lavoura. Por trás disto um robusto sistema de inteligência artificial que vai sendo treinado por especialistas e aprendendo a classificar os insetos. Outros usos além de veículos autônomos são robôs agrícolas, drones, monitoramento da saúde da colheita, reconhecimento facial e sistemas de irrigação automatizados.
O uso de inteligência artificial na Agropecuária vai permitir aos produtores rurais tomarem decisões mais assertivas e em menor espaço de tempo, evitando perdas de produtividade e economizando insumos.

M&E – Quais as culturas e porte de produtores que mais acessam essas tecnologias?
Torres –
No Brasil os drones são muito utilizados em cereais, cana, café, fruticultura… Veículos autônomos já estão presentes em algumas aplicações do cultivo de grãos, citrus e reflorestamento. O monitoramento da saúde da lavoura é comum em grãos, cultivos de inverno. Reconhecimento facial já está embarcado em diversos displays de máquinas, chegando estes displays inclusive a “conversar” com os operadores sobre temas de seu agrado (resultado de jogo de futebol, clima…).
Normalmente os avanços tecnológicos aparecem com custos ainda elevados, sendo adotados em grandes propriedades. Com a adoção da tecnologia há uma popularização e consequentemente redução de custos, permitindo chegar a todos os produtores, independentemente do tamanho da propriedade. Isto aconteceu com a Agricultura de Precisão e certamente acontecerá com o uso da IA no campo.

M&E – Quais os gargalos para uso de agricultura de precisão pelo produtor rural?
Torres –
O maior gargalo pode ser a comprovação do retorno financeiro. Quando o produtor tem certeza de que terá retorno maior que o investimento a adoção é rápida. Isto aconteceu com a aplicação de calcário e fertilizantes em taxas variáveis. Outras tecnologias que não conseguem comprovar rapidamente o retorno financeiro tem adoção mais lenta ou até caem no desuso.
Importante também é que as novas tecnologias sejam “user-friendly”, ou seja, fáceis de se utilizar pelos produtores, operadores, agrônomos e consultores.

M&E – Que ganhos efetivos são obtidos com agricultura de precisão?
Torres –
A Universidade de Purdue, junto à Crop Life Magazine, publica nos USA anualmente um levantamento sobre adoção da AP que traz um quadro com estas informações lá nos USA. Certamente os dados são parecidos com o que vemos aqui nas lavouras do Brasil:

M&E – Como máquinas, implementos e equipamentos contribuem para a popularização do uso de tecnologias de ponta nas propriedades agrícolas?
Torres –
A indústria brasileira de máquinas agrícolas está praticamente no mesmo nível das empresas de países do primeiro mundo, exportando inclusive muitos equipamentos para estes. Temos empresas aqui desenvolvendo tecnologias de ponta, patenteando sistemas de AP ou de IA inovadores e embarcando-os nas máquinas que vão aos campos do Brasil. A velocidade de desenvolvimento da indústria brasileira e o investimento destas em difusão e treinamentos de produtores e operadores com certeza tem “puxado” muito a agricultura nacional para a Agricultura 4.0 e Agricultura 5.0.

M&E – Como tornar essas tecnologias acessíveis às propriedades e produtores?
Torres –
O desenvolvimento de pessoas é fundamental para o sucesso na adoção das tecnologias. Já temos hoje no Brasil diversas universidades com forte atuação nas áreas de agricultura de precisão e de inteligência artificial, formando engenheiros agrônomos, mecânicos e agrícolas com muita competência nestas áreas. Outras iniciativas, como os cursos de Mecanização e Agricultura de Precisão e também o de big data para o agronegócio tem formado centenas de tecnólogos preparados para estes desafios tecnológicos. Senar tem forte atuação nos treinamentos de operadores. Empresas como Bom Futuro investem no Senai. A PPP (Parcerias Público-Privadas) tem dado grande apoio. Treinar pessoas é o caminho”

Fábio Torres
Formado em Engenharia Agronômica, com especializações em Proteção de Plantas (U. F. Viçosa), Irrigação (Unesp Botucatu), Fertilidade dos Solos (Esalq USP) e Manejo de Pragas (London University), Fábio Torres é um dos fundadores da Associação Brasileira de Agricultura de Precisão (AsBraAP) e está entre os diretores da atual gestão. Além de trabalhar na Jacto há 30 anos, em diversas áreas, participou da Comissão Brasileira de Agricultura de Precisão do Ministério da Agricultura e é um dos organizadores do Congresso Brasileiro de Agricultura de Precisão. Possui ainda MBA em Gestão Estratégica pela FGV e MBA em Gestão de Venda pela Fundação Dom Cabral.

AsBraAP

Contribuir para o desenvolvimento científico e tecnológico, inovação e difusão do uso de práticas, técnicas e tecnologias de agricultura de precisão e digital (AP e AD) é o objetivo da Associação Brasileira de Agricultura de Precisão e Digital AsBraAP. Fundada em 2019, reúne empresa, acadêmicos, pesquisadores e profissionais que desenvolvem esse segmento e, a cada dois anos, realiza o Congresso Brasileiro de Agricultura de Precisão.