Nesta entrevista exclusiva do Mapa para a revista Máquinas & Equipamentos, são enfocados temas palpitantes diretamente vinculados ao setor representado pela ABIMAQ, a exemplo de mecanização no campo, Plano Agrícola e Pecuário (conhecido como Plano Safra), linhas de estímulo à aquisição, por parte do produtor rural, de bens de capital, irrigação e projetos de conectividade do campo para favorecer o uso de funcionalidades das máquinas e implementos, entre outros.
A complexidade dos temas exigiu a participação de quatro profissionais do Mapa, lotados em duas secretarias: de Inovação, Desenvolvimento Rural e Irrigação (SDI/Mapa), com Sibelle de Andrade Silva, diretora do Departamento de Apoio à Inovação para Agropecuária, e Frederico Belém, coordenador geral de Irrigação; e de Política Agrícola (SPA/Mapa), com a participação de José Garcia Gasques, coordenador-geral de Avaliação de Políticas e Informação; e Wilson Vaz de Araújo, diretor do Departamento de Crédito e Informação.
Confira e ótima leitura!
Máquinas & Equipamentos – Qual a importância da mecanização do campo e como contribui para o aumento da produtividade da agropecuária nacional?
MAPA – Há uma tendência clara de aumento da mecanização da agricultura brasileira. Os dados do Censo Agropecuário 2017 mostram que, entre 2006 e 2017, a área de lavouras temporárias cresceu 14% no Brasil, enquanto o número de tratores aumentou 50%, atingindo 1.229.907 unidades em 2017.
Observou-se, ainda, que mais de 60% do crescimento do produto da agropecuária se deveu à tecnologia, considerada o fato mais marcante das transformações da agricultura. Sem dúvida, a mecanização tem um papel essencial nesse processo e é grande responsável pela expansão do setor.
Um dos exemplos de como tem sido esse crescimento é a relação área e produção (figura abaixo). Nota-se que o aumento da produção de grãos tem ocorrido principalmente em virtude dos ganhos de produtividade, pois a área tem crescido bem abaixo do crescimento da produção. Finalmente, é importante destacar que a viabilização de várias safras numa mesma área e a adoção de sistemas integrados de produção têm sido possível em virtude da incorporação de novas tecnologias e do aumento da eficiência das operações.
A produção agropecuária brasileira pode ser dimensionada de várias formas. Uma delas, o Valor Bruto da Produção (VBP), que reúne as principais lavouras e a pecuária, ultrapassa R$ 1 trilhão. Na coordenação das políticas públicas de estímulo à agropecuária, fomento do agronegócio e regulação e normatização de serviços vinculados ao setor, está o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) e toda sua estrutura que agrega mais de 11 mil servidores espalhados pelo País.
M&E – Quais as políticas e ações de mecanização do campo desenvolvidas pelo Mapa, incluindo programas do Plano Safra?
MAPA – A mecanização do campo, a partir da adoção de máquinas e equipamentos, tem sido historicamente apoiada pelo Plano Agrícola e Pecuário, a partir das mais variadas linhas de crédito rural.
O crédito rural está entre os maiores fomentadores da mecanização agropecuária brasileira, dado que permite ao produtor financiar suas máquinas e equipamentos com condições de taxas de juros, prazos e carências mais atrativos que aqueles usualmente oferecidos pelo mercado.
Dentre as principais linhas de crédito, merecem destaque:
- Moderfrota – voltado para o financiamento de tratores e implementos associados, colheitadeiras e suas plataformas de corte, equipamentos para preparo, secagem e beneficiamento de café e máquinas agrícolas autopropelidas para pulverização e adubação. Somente na Safra 2020/21, foram aplicados até abril R$ 7,09 bilhões nesse programa, valor 9% superior ao do mesmo período da safra passada;
- Moderinfra – destinado a investimentos relacionados a todos os itens inerentes aos sistemas de irrigação, além de equipamentos para proteção de cultivos e estações meteorológicas. Na safra atual, R$ 766 milhões foram aplicados até abril, mais que o dobro registrado em igual intervalo da safra 2019/20;
- Inovagro – financia equipamentos de geração de energias alternativas, equipamentos para a pecuária e agricultura de precisão, equipamentos para automação de sistemas de criação de animais, dentre outros. Na temporada 2020/21, R$ 1,58 bilhão foi financiado até abril, montante quase 30% superior ao mesmo período da safra passada;
- Programa de Construção e Ampliação de Armazéns (PCA) – permite a aquisição de equipamentos destinados à armazenagem. Nesta safra, até abril, foi financiado R$ 1,84 bilhão para esse programa, volume 63% maior que igual período da última temporada.
Além dos programas mencionados, há, também, a possibilidade de se financiar máquinas e equipamentos em programas como o Pronaf, Pronamp, Moderagro e Prodecoop. Vale destacar que o crédito rural conta ainda com linhas para investimentos em geral, não vinculadas a programas específicos, que também permitem o financiamento de máquinas e equipamentos.
Nesse sentido, o Plano Safra vem permitindo ao produtor rural a modernização de seus sistemas produtivos, proporcionando maior produtividade no campo, ajudando o Brasil a cada vez mais se destacar entre os maiores produtores mundiais de alimentos, fibras e biocombustíveis.
A incorporação de novas tecnologias e o aumento da eficiência das operações viabilizam várias safras numa mesma área e favorecem a adoção de sistemas integrados de produção
M&E – A conectividade é um gargalo para as máquinas, que cada vez coletam mais dados e precisam transmiti-los em tempo real. O que vem sendo feito para vencer o desafio? Quais os planos do Mapa?
MAPA – No universo digital da agropecuária, precisamos lembrar de três aspectos: os dados, a conectividade e os processos de tomada de decisão. Os dados são coletados por sensores e máquinas cada vez mais modernos e compõem os processos de tomada de decisão. Eles geram inovação e possibilitam mais renda para o produtor e maior qualidade de vida para uma sociedade que é e será cada vez conectada e bem-informada. Mas no campo a conectividade em si representa um grande desafio de infraestrutura.
Cerca de 23% do espaço rural agrícola teria “algum nível de conectividade”, o que, infelizmente, não significa ser um acesso de qualidade.
Se conseguíssemos elevar esse valor para chegar próximo de 50% de área coberta, tal avanço resultaria num impacto de 4,5% adicional no Valor Bruto da Produção (VBP) agropecuária (estimativa atual superior a R$ 1 trilhão). Em um segundo cenário, se chegarmos próximo de 75% de cobertura, impacto estimado é de 9,6% a mais no VBP produção agropecuária.
O importante também é verificar que não é necessário esperar espectro e tecnologias mais avançadas, dependendo de cada aplicação no setor. Por exemplo, o 2G atende a muitas demandas do setor, incluindo aplicações de telemetria. Há ainda outras tecnologias móveis nas quais pode-se investir como a conexão satelital; a fibra e mesmo uso de espectro de UHF, VHF e o TV White Space, atualmente em discussão na Anatel.
A partir da ampliação da conectividade rural, os produtores, pequenos, médios e grandes, terão mais conhecimento e oportunidades de uso de dispositivos e sensores que permitam um controle em tempo real da produção. Não se trata apenas de levar conectividade, mas sim de proporcionar conhecimento e aprendizado. A conectividade integrada às estratégias de inovação digital pode tornar exponencial as conquistas da agropecuária até aqui e se soma com a vocação nacional para o agro sustentável.
Há máquinas cada vez mais inteligentes – já se pode falar em agricultura 5.0 – mas a internet no campo deve avançar para se robustecer a inovação agropecuária. Por isso, é fundamental crescer neste componente de infraestrutura por meio da ampliação da conectividade. E assim, progressivamente, avançar cada vez mais nos componentes de tecnologia.
O Mapa tem ações concretas para ampliar a conectividade, a partir de projetos que empregam as tecnologias 3G, 4G e de conexão via satélite, principalmente. E, nos próximos meses, esse esforço será acentuado, incluindo o uso do 5G.
O Brasil se consolidou como potência agroambiental sustentável mesmo com os desafios atuais da conectividade rural. E pode ir muito além a partir da consolidação de uma hiperconexão no campo e do campo com cidade, fundamentada em conhecimento e inovação. Dessa forma, será possível gerar uma verdadeira “infovia” do agro, sólida e que produz cada maior riqueza e qualidade de vida.
Entre as mais recentes realizações está o balizamento das ações com base no estudo denominado “Cenários e Perspectivas da Conectividade para o Agro”, realizado pela Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq/USP). Por ocasião da divulgação do trabalho, em maio, foi anunciada parceria do Mapa com o Ministério das Comunicações com a meta de universalizar a conectividade no campo e favorecer o uso da tecnologia e a fixação do jovem no campo.
M&E – Há alguma ação de estímulo à irrigação em realização e/ou prevista?
MAPA – Está em fase de elaboração, por esta pasta, o Programa Nacional de Agricultura Irrigada – “Irriga Mais”, que consiste na estruturação de ações para acelerar o crescimento da agricultura irrigada no País, em virtude do grande potencial existente. Atualmente, cerca de 55 milhões de hectares – ocupados com cultivo de agricultura de sequeiro e pastagem – podem ser transformados em agricultura irrigada, com condições de recursos hídricos suficientes para esse avanço e sem interferir em outros usos.
Para concretizar esse crescimento, o programa tem como estratégia tratativas para aperfeiçoar alguns normativos, no âmbito federal e estadual, a partir da revisão dos modelos de gestão de recursos hídricos para obter celeridade na emissão de outorgas e evoluir para as outorgas coletivas e sazonais.
Além disso, é necessária a revisão da legislação sobre a supressão vegetal para construção de barramentos e reservatórios para acúmulo de água, para fins agropecuários. Para o avanço da agricultura irrigada, é preciso reservar o excesso de água dos períodos chuvosos para a utilização em momentos de menor disponibilidade. É nessa linha que o programa pretende apresentar propostas.
Outra frente que será trabalhada no “Irriga Mais” é a identificação de áreas para expansão em agricultura irrigada e que necessitam de um suporte nas redes de distribuição e melhoria de carga de energia elétrica. Assim, o ministério realizará tratativas com o Ministério de Minas e Energia (MME) para indicar a necessidade de potencializar a instalação de infraestrutura elétrica nesses territórios. Esse suporte poderá acelerar a implantação de novas áreas irrigadas e melhorar as condições de áreas já implantadas, estimulando os agricultores irrigantes a instalar seus equipamentos de irrigação e modernizar os seus sistemas.
Adicionalmente às iniciativas sobre energia elétrica, o programa contemplará uma ação para construção de usinas fotovoltaicas em regiões estratégicas, em parceria com associações de irrigantes, conforme preconiza a Política Nacional de Irrigação. Essa estratégia vai levar energia elétrica para regiões com alto potencial de expansão de áreas irrigadas e que estão mais distantes de linhas de distribuição e em regiões que têm problemas de carga de energia. A expectativa é também minimizar os impactos dos altos preços das tarifas de energia elétrica por meio da implantação dessas usinas, possibilitando a sustentabilidade financeira dos agricultores irrigantes.
O programa também deverá incentivar a implantação de novos modelos de gestão, de base territorial, em áreas onde há adensamento irrigado, a partir do suporte no monitoramento das bacias hidrográficas, de ações de conservação do solo e da água, e do aperfeiçoamento da gestão da bacia, que possibilitarão otimizar o uso da água nesses territórios.
A mais recente iniciativa nesse campo data de abril. Trata-se do Programa de Fomento à Agricultura Irrigada no Nordeste (Profinor), lançado pelo Mapa e o Banco do Nordeste (BNB), com a meta de estimular o crescimento da agricultura irrigada no Nordeste, norte de Minas Gerais e norte do Espírito Santo.
M&E – Como a indústria de máquinas e equipamentos pode contribuir para que o agro continue batendo recordes de produção?
MAPA – Uma avaliação do papel ou da contribuição que a indústria de máquinas e equipamentos tem trazido pode ser observada pelos resultados que o País tem apresentado nos últimos anos. Os resultados das safras têm mostrado recordes de produção de grãos. Isso tem-se convertido em resultados financeiros bastante favoráveis. Neste ano, o Valor Bruto da Produção Agropecuária (VBP), que reúne as principais lavouras e a pecuária, está estimado em mais de R$ 1 trilhão. Esse resultado é recorde na série desde 1989.
Estrutura do Mapa
Sob a área de influência do Mapa, estão o pequeno, o médio e o grande produtor rural, as atividades de fornecimento de bens e serviços à agricultura, produção agropecuária, processamento, transformação e distribuição de produtos de origem agropecuária até o consumidor final. Desse modo, promove a integração do desenvolvimento sustentável e da competitividade, garantindo a segurança alimentar da população brasileira e a produção de excedentes para exportação, fortalecendo o setor produtivo nacional e favorecendo a inserção do Brasil no mercado internacional.
Suas ações são voltadas a promover o desenvolvimento sustentável das cadeias produtivas agropecuárias, em benefício da sociedade brasileira, busca integrar sob sua gestão os aspectos mercadológico, tecnológico, científico, ambiental e organizacional do setor produtivo e também dos setores de abastecimento, armazenagem e transporte de safras, além da gestão da política econômica e financeira para o agronegócio.
Para a consecução de seus objetivos, o Mapa conta com estrutura fixa composta por oito secretarias (incluindo o Serviço Florestal Brasileiro (SFB), 27 superintendências estaduais e suas respectivas unidades, rede de seis laboratórios, além do Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet) e da Comissão Executiva do Plano da Lavoura Cacaueira (Ceplac), que estão no âmbito da SDRI, e o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra).
Agrega, ainda, como empresas públicas sob sua ingerência e coordenação, a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) e a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), que somam-se a entes descentralizados do ministério, organizados sobre a forma de sociedades de economia mista: Centrais de Abastecimento de Minas Gerais S.A (Ceasa/MG), Companhia de Armazéns e Silos de Minas Gerais (Casemg) e Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais de São Paulo (Ceagesp).
Além disso, coordena as ações e políticas de 31 Câmaras Setoriais e 5 Câmaras Temáticas relacionadas aos diversos setores produtivos do agronegócio brasileiro. Há ainda a atuação de 28 adidos agrícolas no Exterior.