Indústria de Defesa: Mercado PROMISSOR, com peculiaridades específicas

Respondendo por cerca de 3,7% do PIB (Produto Interno Bruto) e com o quarto maior orçamento da União – cerca de R$ 101 bilhões, desconsiderado o Regime Geral de Previdência Social (RGPS) – a Defesa é um mercado extremamente atraente, em que pese o limite imposto pela PEC dos Gastos Públicos por mais 19 anos.

Há ainda a considerar os projetos estratégicos das três Forças – Marinha, Exército e Aeronáutica – inseridos no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), totalizando mais de R$ 6,4 bilhões. Soma-se a isso o investimento de cada uma das Forças, com destaque para a construção de quatro corvetas classe Tamandaré para a força naval, com valores previstos da ordem de US$ 1,6 bilhão.

Manutenção das instalações e equipamentos existentes, assim como fornecimento de peças de reposição e sobressalentes também estão relacionados. Apenas na Marinha, há três projetos previstos para 2019: manutenção geral do navio-escola Brasil, na Base Naval do Rio de Janeiro; docagem da Fragata Greenhalgh (AMRJ) e manutenção geral do navio-tanque Almirante Gastão Motta, ambos no Arsenal de Marinha no Rio de Janeiro.

Os números consolidados, de acordo com o Stockholm International Peace Research Institute, no 2017 Fact Sheet, elaborado com base nos dados de gastos militares de 2016, colocam o Brasil em 13º lugar global, com gasto de US$ 22,8 bilhões, correspondente a 1,3% do PIB. A título de comparação, o primeiro são os Estados Unidos, com 3,3% do PIB e US$ 611 bilhões, seguido de China, Rússia, Arábia Saudita, Índia e França.

Informações veiculadas pelo portal Siga Brasil, do Senado Federal, sinaliza que, nos últimos cinco anos, o orçamento do Ministério da Defesa aumentou, embora às vezes apenas na proporção do crescimento do PIB brasileiro, o que fica aquém das necessidades da pasta. Em 2013, por exemplo, o orçamento do Ministério da Defesa foi de R$ 69,7 bilhões e, em 2017, ficou ao redor de R$ 92,2 bilhões.

E a intenção de fortalecer a participação da indústria de máquinas e equipamentos nesse segmento – seja como participante de fornecimentos para projetos em andamento ou previstos, seja na manutenção do parque instalado – motiva a ABIMAQ – Associação Brasileira da Indústria de Máquinas – a investir no relacionamento com o Ministério de Defesa e as Forças Armadas, realizando eventos para informação do setor representado pela entidade, que, de modo direto, atinge 16 Câmaras Setoriais e um Grupo de Trabalho, mas encontra ressonância em praticamente todas as atividades representadas pela entidade.

O ponto alto dessas ações envolveu, em novembro de 2018, o anúncio da criação do Conselho de Mercado da Indústria de Defesa, com o objetivo de promover a articulação com órgãos públicos e entidades do setor, Ministério de Defesa e de Relações Exteriores; desenvolver ações de cunho institucional e apoiar o PL 10.834/10, do Poder Executivo, que visa a modificar a distribuição do Adicional ao Frete para a Renovação da Marinha Mercante (AFRMM) e do Fundo da Marinha Mercante (FMM), direcionando ao Fundo Naval recursos para a renovação de material flutuante da Marinha e acrescentando dispositivos à Lei 10.893/04.

“A intenção é que o País, a partir desse setor, possa desenvolver novos modos de incorporar ciência, tecnologia e inovação nos bens e serviços produzidos, esse movimento favorece também as exportações de produtos de defesa”, afirma Roberto Veiga, presidente do Conselho da Indústria de Defesa, destacando o papel do Conselho no desenvolvimento de ações de cunho institucional e mercadológico com vistas “à maior integração das empresas associadas, bem como a promover a articulação com órgãos públicos e demais empresas estatais e/ou privadas integrantes da Base Industrial de Defesa (BID) participantes na pesquisa, desenvolvimento, produção, distribuição e manutenção de produtos, bens e serviços para o setor de defesa objetivando principalmente a identificação de oportunidades de fornecimento dos associados em projetos a serem desenvolvidos pelas Forças Armadas”.

Formação e informação

Ainda no mês de novembro, aconteceram dois eventos de aproximação, um na sede em São Paulo (SP), com a presença do Vice-Almirante Marcelo Francisco Campos, secretário de Produtos de Defesa do MD, e representantes das Forças Armadas; e outro em São José dos Campos (SP), direcionado a indústrias interessadas em conhecer o Regime Especial de Tributação para a Indústria de Defesa (Retid).

Outra ação implementada – dessa vez pela sede do Rio de Janeiro, que também opera como escritório de ligação com as Forças Armadas e a Marinha – envolveu visita às embarcações da Marinha do Brasil com o objetivo de identificar demandas para a manutenção da frota atual. Além disso, a ABIMAQ mantém um escritório de ligação para a Aeronáutica – em sua sede do Vale do Paraíba (São José dos Campos-SP) – e um escritório de ligação para o Exército e o Ministério de Defesa, em sua sede de Brasília (DF).

Desse modo, a ABIMAQ e as Forças Armadas interagem na busca de soluções capazes de, como define José Velloso – presidente executivo da ABIMAQ –, promover “o casamento da demanda e de quem supre a demanda”. Para o Vice-Almirante Marcelo Francisco Campos, secretário de Produtos de Defesa (Seprod) do Ministério da Defesa, o relacionamento mais próximo com o setor produtivo favorece a operacionalização do MD e das três Forças, pois, “comprar no Brasil, significa logística e domínio do ciclo de vida dos produtos, desde a concepção até o desfazimento, que é importante e também envolve tecnologia e custos que precisam ser estudados no início do projeto”.

Convergência

Discorrendo sobre o entrosamento da base empresarial e industrial brasileira com as Forças Armadas, o engenheiro naval Arthur de Almeida Júnior – membro do Conselho Nacional da Indústria de Máquinas (CONIMAQ), além de ser responsável pelo escritório de ligação da ABIMAQ com o Ministério da Defesa e a Marinha – fala sobre as convergências entre as demandas das Forças, principalmente por sobressalentes, e a capacidade local de fornecimento.

“Do lado das Forças temos um conjunto de meios com disponibilidade operacional limitada, menos, a nosso ver, pela questão da idade média das frotas: helicópteros, blindados, barcos e navios, aviões, etc. e mais pela dificuldade de acesso aos sobressalentes ou às atualizações de sistemas que façam sentido. Do lado da indústria temos uma virtualmente ilimitada capacidade de fornecimento, que garante não somente a delicada questão da soberania nacional como a efetiva possibilidade de que as Forças possam, operando os meios disponíveis, cumprir sua missão constitucional”, afirma Arthur de Almeida, ressaltado a importância de “os atores se coordenarem e resolverem os problemas existentes, da disponibilidade dos meios, em caráter imediato”.

No mesmo diapasão, Rodolfo Garcia, presidente da Câmara Setorial de Válvulas Industriais (CSVI), sugere a hierarquização das demandas das Forças Armadas e a coordenação de esforços para seu atendimento, o que “possibilita que mantenhamos a disponibilidade dos meios em nível elevado, altamente necessário à manutenção de nossa soberania pela capacidade dissuasiva. Como efeito corolário, os fornecimentos às nossas Forças Armadas habilitam nossas empresas a fornecimentos aos países signatários da OTAN e às Forças Armadas dos países que se balizam pelo sistema OTAN, como alguns de nossos países vizinhos”, frisa.

Cadastro

Quando o assunto é fornecimento para as Forças Armadas brasileiras ou vinculadas ao Tratado do Atlântico Norte, o fundamental para participar é a empresa se cadastrar no Centro de Apoio a Sistemas Logísticos de Defesa (Caslode), que desde o final de 2017 substitui o Centro de Catalogação de Defesa (Cecade), do Ministério da Defesa (MD). É preciso, também, a empresa e seus produtos estarem inscritos no Sistema de Cadastramento de Produtos e Empresas de Defesa (SisCaPED).

Já existe na ABIMAQ um departamento criado especificamente para facilitar o cadastramento de seus associados junto ao Ministério da Defesa, viabilizando o reconhecimento da capacidade de cada empresa pelo Exército, Marinha e Aeronáutica, informa José Wilmar de Mello, presidente da Câmara Setorial de Máquinas, Equipamentos e Componentes do Setor de Defesa e Aeroespacial (CSDAER). “Acredito que o principal ponto positivo dessa relação tem sido a sinergia que está sendo criada entre as Forças e as empresas, pois há muitas barreiras que existem por desconhecimento dos negócios tanto por parte das Forças, que estão conhecendo melhor a capacidade das indústrias de nosso país, como também por parte das empresas, que estão tendo a oportunidade de conhecer as necessidades das Forças”, resume Mello.

É também nessa necessidade de catalogação que o membro do CONIMAQ, apega-se, lembrando que a ABIMAQ “já se movimenta para solucionar os problemas identificados. Cabe às empresas, catalogar os produtos com a terminologia apropriada, seguindo o Sistema de Catalogação do Tratado do Atlântico Norte (OTAN), que define, perfeitamente, o item e sua semântica nas diversas línguas, associando-o ao fabricante ou distribuidor e ao país de origem, pois para o mesmo item poderá haver mais que um fornecedor e esse fornecedor poderá estar em mais de um país”.

O cadastramento de empresas fabricantes ou fornecedores e a catalogação dos itens componentes dos produtos e serviços comprados, para Almeida – quando o assunto envolve as compras cotidianas de novos equipamentos, manutenção e sobressalentes – transcende a questão dos produtos de caráter bélico, como armamentos e munições. A sugestão do engenheiro naval é a de que “as Forças Armadas hierarquizem suas prioridades de disponibilidade de meios, que informem à base industrial representada pela ABIMAQ os itens sobressalentes demandados (insumos, serviços, produtos e sistemas), que as instituições de fomento, entre elas a Seprod (Secretaria de Produtos de Defesa do MD), a FINEP, a FAPESP e o BNDES, forneçam às Forças o numerário necessário à compra do que falta e, portanto, causa a indisponibilidade da frota”.

No âmbito da Câmara Setorial de Motores e Grupos Geradores, a maioria das associadas já detém cadastro junto ao Sistema de Defesa, de acordo com informações de Reinaldo Sarquez, presidente da CSMGG. A tarefa em desenvolvimento compreende o aprimoramento da compreensão “sobre os requisitos do Caslode, uma vez que ele é a ferramenta que nos permitirá o acesso à OTAN. Tão logo tenhamos absorvido todos os conceitos do Caslode, poderemos propor adequações ao sistema, de modo a incrementar a disponibilidade de nossos produtos para a Defesa e consequentemente para a OTAN”.

A recomendação do cadastro também é feita por empresas que já são fornecedoras das Forças de Defesa, como é o caso da Vulkan Couplings, que fornece para a Marinha do Brasil. Elisângela Melo dos Santos, diretora de Vendas, ressalta que ao integrar o Caslode, “a Vulkan passou a integrar o cadastro da Otan, e o portfólio fica visível para as Forças de Defesa mundialmente”.

Elisângela Santos destaca, também, a contribuição da ABIMAQ: “A CSENO faz um excelente trabalho e constantemente promove reuniões com a Indústria de Defesa/Marinha do Brasil para facilitar o acesso das associadas ao cadastro. O que falta é liberação de investimento por parte do governo para a Marinha do Brasil renovar e fazer as devidas manutenções da sua frota, bem como faltam novos projetos na área naval em geral”.

Aperfeiçoamento

Sarquez alerta para o fato de que, em decorrência da concepção, o Caslode apenas permitir a oferta de produtos similares aos que já se encontram catalogados no Sistema da Defesa; não havendo possibilidade de oferecer subconjuntos ou peças que compõem um produto. “Nossas empresas não estão somente capacitadas a fornecer nossos produtos ao Ministério da Defesa, como também tem potencial para prover peças de reposições em tempo hábil, manutenção preventiva e corretiva, pois têm à disposição corpos técnicos gabaritados, para análises e correções de problemas”, reforça.

“Estamos incipientes no processo, e as ações necessitam se tornar fluidas”, resume o presidente da CSVI, citando como ponto positivo o fato de que “parte dos profissionais da presente gestão do Seprod se sensibilizaram para a questão de soberania e de disponibilidade dos meios, e o mesmo está ocorrendo no seio da Marinha do Brasil”. Já o presidente da CSMGG, com a certeza de que “o nosso Ministério da Defesa detém interesse em incentivar a indústria nacional”, lista, entre os próximos passos, “propor aberturas para tornar o sistema mais flexível quanto à oferta de subconjuntos ou peças que compõem um produto”.