A pesquisa da CNI, somada ao estudo da UFOP, lista os custos entre os gargalos na implementação das iniciativas da indústria 4.0, pois demandaria aumento de investimento de 50%, ao longo de cinco anos. A disposição para gastar, por sua vez, esbarra na falta de compreensão dos empresários sobre os benefícios e resistência à adoção.
Isso soma-se à necessidade de investimento contínuo, à pressão da personalização na produção em massa e aos impactos das mudanças climáticas.
Gastar muito sem a segurança de contar com mão de obra qualificada, enquanto mantém produção e contas em dia, é uma barreira intransponível para a maioria.
A tecnologia traz com ela impactos que ultrapassam as máquinas e os equipamentos e atingem a mão de obra, contribuindo, por exemplo, para minimizar o déficit de mão de obra qualificada. Segundo o Mapa do Trabalho 2022-2025, elaborado pelo Observatório Nacional da Indústria (ONI) da CNI, projeta a necessidade de qualificar cerca de 14 milhões de trabalhadores para atender às demandas da indústria nos próximos anos. Desse total, 2,2 milhões precisarão de formação inicial e 11,8 milhões de requalificação para se adaptarem às transformações tecnológicas.
A Pesquisa de Escassez de Talentos 2024 da ManpowerGroup corrobora esse cenário, apontando que 81% dos empregadores brasileiros enfrentam dificuldades para encontrar profissionais com as habilidades necessárias.
Agrega-se a isso o fato de que, segundo estudo da LCA Consultoria, datado de agosto de 2023 elaborado com base na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a idade média do trabalhador brasileiro, considerando todos os segmentos da economia, é de 39,3 anos.
Esse envelhecimento afeta grandemente o setor industrial, inclusive porque as atividades usuais são pouco atraentes para os jovens, que estão preferindo iniciar sua carreira em novos espaços, como aplicativos e trabalhos 100% digitais.
Trabalhar com graxa, em ambientes quentes, em serviços de maior esforço físico, não tem motivado os jovens, como mostram os dados. Contudo, o Perfil da Indústria Brasileira de Máquinas e Equipamentos, estudo realizado anualmente pela ABIMAQ, constata que os salários no setor são em média cerca de 30% superiores ao salário médio brasileiro, o que reflete o valor atribuído à expertise e à qualificação dos profissionais envolvidos.
“A falta de mão de obra qualificada não é um problema exclusivo do Brasil, mas aqui fatores específicos agravam a situação. O envelhecimento da população devido à baixa taxa de natalidade, a falta de qualificação adequada, a mudança no perfil profissional, as condições de trabalho e os baixos investimentos em educação técnica são alguns dos elementos que contribuem para este cenário”, relata Delgado, apontando que “o resultado é a redução da disponibilidade de recursos humanos para a produção, o aumento de custos e a dificuldade em inovar. Essa escassez também afeta diretamente a capacidade da indústria em acompanhar os avanços tecnológicos e atender demandas do mercado, impactando a produtividade e a competitividade das empresas.”
Trabalhando em diversas frentes e parcerias para mitigar esse problema, a ABIMAQ criou o programa-piloto Trilha de Formação Industrial para Produtividade (FIP), em parceria com o SENAI, que requalifica profissionais da indústria com módulos focados no aperfeiçoamento e na excelência operacional. Delgado também destaca o Programa de Aprendizagem Industrial do SENAI, voltado à formação técnica de jovens, “uma excelente oportunidade para as empresas investirem em recrutamento e diversidade.”
Outra iniciativa é o Programa Inova Talentos, do Instituto Euvaldo Lodi (IEL) em parceria com o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), que visa atrair e capacitar jovens talentos para projetos de tecnologia e inovação em empresas.
E mais: A ABIMAQ, através de sua Diretoria de Tecnologia, participa ativamente de grupos de trabalho da Mobilização Empresarial pela Inovação (MEI), contribuindo com o Governo Federal na reformulação de cursos técnicos e na implementação da metodologia STEAM (Science, Technology, Engineering, Arts, Mathematics) desde o ensino fundamental.
“Acreditamos na importância de uma abordagem que atue em diferentes frentes para enfrentar a escassez de talentos. Investir em desenvolvimento de habilidades, flexibilizar as condições de trabalho e revisar as políticas de atração e retenção são passos essenciais. Além disso, é crucial promover a indústria como uma carreira atrativa para os jovens, destacando as oportunidades de boa remuneração e crescimento profissional”, destaca o diretor de Tecnologia da ABIMAQ.
Adaptação dos currículos de formação profissional
Para o gerente de Relações com o Mercado do Senai-SP, o principal desafio na formação de mão de obra para operar máquinas e equipamentos com tecnologias avançadas é alinhar o ritmo acelerado das inovações tecnológicas à velocidade de atualização dos currículos de formação profissional. Operar equipamentos modernos demanda mais do que comandos manuais tradicionais; exige interpretação de dados, interação com interfaces digitais e, muitas vezes, conhecimentos básicos em programação e automação. Essa nova realidade demanda um perfil profissional mais versátil, adaptável e orientado a dados.
O Senai vem enfrentando esses desafios com a adoção de uma abordagem diferenciada e inovadora, também orientada por dados para formar profissionais capazes de impulsionar a criação e transformação da nova indústria, enfatiza Souza: “Nesta abordagem, o foco é conectar o que há de mais avançado no mundo às necessidades da indústria local. Para isso, analisa perfis profissionais adotados em países como Estados Unidos, União Europeia, Austrália e Nova Zelândia, e cruza essas informações com os desafios e demandas da indústria paulista, resultando em soluções educacionais altamente alinhadas com as demandas do mercado local e as transformações industriais globais.”
Especificamente para o setor de máquinas-ferramentas, o Senai-SP recentemente atualizou o itinerário formativo das áreas de Plásticos, Corte-Dobra-Repuxo (CDR) e Aerospace, com foco na alta demanda por profissionais qualificados. Esses cursos – explica Souza – “preparam trabalhadores com domínio de ferramentas digitais e enfatizam não apenas a operação de máquinas, mas também a engenharia, essencial para mercados de baixa escala e alto valor agregado, como é o caso de ferramentais.”
Essas formações – ofertadas em polos industriais estratégicos como São Bernardo, Guarulhos, Jundiaí e Itu (Plásticos); Campinas, Sorocaba e Limeira (CDR); Campinas, Botucatu e São José dos Campos (Aerospace) – incluem desde simulações digitais avançadas (para prever e mitigar problemas como enrugamento ou repuxo no setor CDR e determinar pontos ótimos de injeção em moldes plásticos), até o uso integrado de tecnologias CAD, CAM, CAE e sistemas de gerenciamento de dados (PDM). O objetivo é formar profissionais aptos a atuar com assertividade desde o projeto até a produção, especialmente em contextos em que peças são únicas e erros são críticos e de alto custo.
