Setor cresce em meio à pandemia

O ano 2020 está se caracterizando por ser inesquecível para a grande maioria da população do planeta, senão para todos os habitantes. Naturalmente, há situações inesquecíveis, positivas e nem tanto. O setor de bens de capital mecânico integra o primeiro grupo.

Comprovando a afirmação, estão os números do setor, coletados junto aos associados da ABIMAQ pelo Departamento de Competitividade, Economia e Estatística (DCEE). De acordo com Maria Cristina Zanella – diretora executiva do DCEE –, em setembro, “a receita líquida do setor de máquinas e equipamentos cresceu 13,3% na comparação com o mesmo mês de 2019. Na somatória janeiro-setembro acumulamos queda de 1,3% devido à forte retração durante o pico da pandemia”.

Os resultados positivos atingem também outros indicadores do mercado nacional: “As receitas internas têm ajudado nessa estabilização do setor de máquinas, motivadas por possível compensação das vendas interrompidas no período mais crítico da Covid-19, por uma melhora em segmentos como máquinas agrícolas e alguma substituição de máquinas importadas por nacionais”, comenta Zanellla, frisando que, “em setembro, o crescimento foi da ordem 22,9% na comparação interanual, o que leva ao avanço acumulado de 3,5% até o momento”.

Mesmo que a evolução não seja homogênea, os números coletados mensalmente pelo DCEE da ABIMAQ mostram que alguns setores representados pela Entidade estão em fase positiva, motivada fundamentalmente pelo mercado interno. Esta matéria ouviu representantes de atividades que estão destacando-se positivamente durante a pandemia, tais como fabricantes de máquinas e equipamentos para agronegócio em diversas de suas vertentes, saúde, alimentação, construção civil e higiene e limpeza.

O número de empregos gerados também evoluiu pelo terceiro mês consecutivo, registrando 314,8 mil postos de trabalho em setembro, recompondo estrutura perdida com a pandemia. “A continuação das contratações dependerá da expansão da capacidade instalada nos próximos meses”, alerta a diretora executiva do DCEE.

Um mix de fatores respondem por esses resultados, como redução da demanda durante a pandemia, responsável por ajuste na produção, somada à retomada mais forte do que a esperada, provocando descompasso entre a oferta e a demanda, resume Zanella, agregando a essa situação “a desvalorização cambial e a aceleração na China, elevando a procura por determinados insumos”.

Para o futuro – prevê Zanella – é esperada acomodação no ritmo de crescimento, tanto da produção, como dos preços de insumos, rumo a patamares compatíveis com a expansão do PIB.

Retomada irregular

Analisando setorialmente a atividade de máquinas e equipamentos, Zanella ressalta que o aumento na utilização da capacidade em máquinas para bens de consumo atingiu o patamar de 87,7%, infraestrutura e indústria de base situou-se em 89,6% e máquinas agrícolas, na casa dos 79,5%. O faturamento por setores, por sua vez, apresenta comportamento desigual, com significativa melhora no setor de máquinas agrícolas, que acumula alta superior a 10% no ano.

“Quando vemos dados gerais de produção de bens de capital, notamos que, apesar da produção ainda estar em patamares inferiores, alguns produtos mostram reação. Além das máquinas agrícolas, vemos os bens seriados apresentando alguma recuperação”, avalia Zanella, alinhando desafios nessa retomada: “Vemos nesse processo inicial um aumento generalizado dos preços de insumos, em relação ao período anterior. Muitos industriais relatam maior dificuldade de acesso a estes bens. Os produtos mais mencionados são embalagens, aço e ferro, além de plásticos e outros insumos”.

Os dados gerais de produção de bens de capital, segundo pesquisa da DCEE, sinalizam que, apesar da produção ainda estar em patamares inferiores, alguns produtos apresentam
alguma recuperação. A quedas nas exportações, no entanto, afeta o resultado do setor como um todo.

Contudo, há um ponto fora da curva relativo às exportações. Interferindo positivamente durante alguns anos na performance do setor de máquinas, neste ano, ao contrário, sofre forte recuo, principalmente nos segmentos de logística e construção civil (-42,1%); petróleo e energia renovável (-30,8%); e infraestrutura e indústria de base (-28%).

Essa condição desfavorável das exportações, agravada pela Covid-19 e muitas incertezas com relação aos principais destinos das vendas internacionais a partir do Brasil, fará com que, em 2021, o setor de máquinas e equipamentos seja premido a contar mais com o mercado interno. “A Europa vive uma segunda onda da Covid-19, o que impactará em novas medidas de distanciamento social e maior restrição de circulação de pessoas, com reflexos na economia. Nos EUA, há incertezas tanto políticas, quanto relacionadas ao pacote de estímulo fiscal”, constata a titular do DCEE.

Pandemia contribuiu para preservar atividades

O comportamento dos diversos setores que compõem a área de bens de capital mecânico é heterogêneo. No atual cenário alguns destacam-se por vincularem-se às áreas de saúde, alimentação e higiene e limpeza.

Segundo declarações de presidentes das câmaras setoriais da ABIMAQ que congregam as indústrias com atuação ou interesse nesses campos, a pandemia está contribuindo para que muitas empresas obtenham resultados positivos e até expressivos.

No caso da Câmara Setorial de Máquinas e Acessórios para Indústria do Plástico (CSMAIP), como informa seu presidente, Amilton Mainard, “de início houve muita preocupação de todo o setor, com registro de alguma paralização nas atividades principalmente nos meses de março e abril, a seguir houve retomada acelerada nas vendas e na produção, mas, de uma maneira geral, não houve quedas significativas nem nas vendas nem na produção”.

Embora não descarte problemas pontuais em algumas empresas, Mainard crê que as metas das associadas devem ser cumpridas em 2020, proporcionando crescimento ao redor de 10% sobre 2019, que “foi mais um ano altamente positivo para o setor, que desde 2015 vem evoluindo”.

A Câmara Setorial de Máquinas para a Indústria Alimentícia, Farmacêutica e Refrigeração Industrial, por sua vez, reúne muitos segmentos industriais que foram fortemente demandados este ano, inclusive com desenvolvimento de produtos e soluções vinculados diretamente à manutenção da vida.

“As empresas ficaram com o ponteiro da bússola desnorteado. Passado o momento inicial de quase pânico, os negócios foram voltando pouco a pouco, a ponto de hoje, de acordo com as informações fornecidas pelas empresas, atestarmos crescimento, ainda que não significativo, para a maioria das associadas à CSMIAFRI. Algumas até estão superando seus planos, como alimentos e bebidas para consumo imediato, que computam significativos aumentos de vendas”, prevê Fernando Dias Gomes, presidente da CSMIAFRI.

Entretanto, entre as 220 indústrias dessa câmara setorial há extremos, assim reportados por Gomes: “Com a transferência dos hábitos dos consumidores, as empresas produtoras de equipamentos ligados ao consumo de rua, como restaurantes, shoppings, bares, cafés, sorveterias, docerias, viram suas vendas serem reduzidas significativamente, com impactos no setor industrial”.

Opostos também marcam o setor de Máquinas e Equipamentos para Limpeza, agrupado na CSMLIMP, presidida por Régis de Siqueira: “Começamos este ano com perspectiva de crescimento. Com a pandemia, associadas voltadas a hotelaria, hospital, prestadoras de serviços de limpeza, hospitais, entre outros, acharam que, como a limpeza era o principal meio de combate à pandemia, o setor teria aumento de vendas. Contudo, com o passar dos meses, houve queda de faturamento. As empresas fizeram muita manutenção em máquinas comercializadas anteriormente e se reinventaram. Já as associadas com presença no agronegócio superaram as metas”.

E o agronegócio contribuiu efetivamente para o desempenho de muitas empresas com atividades próximas a ele, com exceção em culturas como flores e hortifrútis. Assim, as associadas da Câmara Setorial de Máquinas e Implementos Agrícolas – CSMIA, de um modo geral, vivenciam cenário positivo.

Como explica Pedro Estevao B. de Oliveira, presidente da CSMIA, “o agronegócio brasileiro não parou e está batendo recordes na produção de grãos e nas exportações. Nesse contexto, a indústria de máquinas agrícolas também está tendo um ano muito bom. No acumulado do ano, o faturamento cresce 10% quando comparado a 2019, percentual muito significativo, que faz de 2020 o melhor ano desde 2013”. A valorização do dólar em torno de 30%, também colabora para a venda de máquinas e implementos agrícolas, por ampliar a lucratividade dos agricultores.

A indústria fabricante de Máquinas Rodoviárias é outra que interage com o agronegócio, o que leva Alexandre Bernardes, presidente da CSMR a afirmar que “em 2020, considerando o cenário de pandemia, a performance é positiva, porque o agronegócio e a construção civil, que utilizam largamente máquinas rodoviárias, contribuíram para o comércio de máquinas rodoviárias e equipamentos”.

Há outros fatores a ratificar o ambiente de negócios favorável para as empresas do setor de construção. “O mercado imobiliário é impulsionado pelas baixas taxas de juros. A infraestrutura se beneficia dos investimentos das prefeituras e das recentes mudanças regulatórias”, esclarece Bernardes, confiante de que o novo marco legal do saneamento básico atrairá “investimentos do setor privado, além de aquecer as discussões sobre os novos marcos legais para gás, ferrovias, transporte público e energia elétrica”. O segmento de máquinas para construção, puxado pela agricultura, construção civil e mineração, também foi positivamente influenciado pela atividade de aluguel de máquinas (Rental).

Perspectivas animadoras

Naturalmente, 2021 refletirá 2020, contudo, algumas poucas empresas sofrem impactos negativos. Em decorrência disso, o planejamento para o próximo ano – verifica Mainard – vem sendo desenhado “de maneira bem positiva com previsão de retomada e crescimento, porque, no último trimestre, os negócios praticamente voltaram ao normal”.
A perspectivas no médio prazo para a indústria de máquinas agrícolas continuam positivas em decorrência de o Brasil ser grande fornecedor de alimentos para o mundo. No entanto, a lista de incertezas – continuidade da ajuda emergencial, reforma tributária, taxa de câmbio, inflação e controle da pandemia, entre outras – leva Gomes a preconizar: “Se não acontecer redução de vendas, já será uma vitória”.

Para o próximo ano, na ótica do presidente da CSMR, “há grande otimismo, dada a expectativa de mais uma produção recorde de grãos e a retomada de obras de infraestrutura. O segmento de máquinas de construção tem espaço para manter o crescimento de dois dígitos, devido à alta nos negócios puxada, principalmente, pelos segmentos de commodities agrícolas e metálicas, assim como as áreas de infraestrutura e logística ligadas a essas operações. A expectativa para as exportações em 2021 também é positiva, pois os mercados da América Latina deverão crescer no próximo ano, considerando que a pandemia esteja sob controle”.