Estímulo à inovação é prioridade para o Brasil

Luiz Otávio Pimentel, presidente do Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI)

28 de julho de 2015, para o cargo de presidente do Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI), o advogado Luiz Otávio Pimentel sabia da variedade de desafios que deveria enfrentar à frente da autarquia federal vinculada ao Ministério de Indústria, Comércio Exterior e Serviços (MDIC). Graduado em 1984 em Ciências Jurídicas e Sociais pela Faculdade de Direito de Cruz Alta (RS), com mestrado em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina (1993) e doutorado em Ciências Jurídicas, curso na Universidade de Barcelona e tese na Universidade Nacional de Assunção (1999), Luiz Otávio Pimentel sabia apenas que seus próximos dias envolveriam uma série interminável de desafios em todos os níveis, em todas as frentes, colocando à prova toda a sua experiência profissional e exigindo o máximo das várias expertises acumuladas em anos anteriores.

À frente do INPI vem deparando-se com todo tipo de enfrentamento e deles vem extraindo resultados positivos, tanto pessoais, quanto administrativos e operacionais. Suas batalhas diárias variam da carência de profissionais qualificados (também conhecidos como ‘examinadores’) ao contingenciamento do governo federal que estabeleceu corte linear de 44% no limite de empenho, passando pelo nefasto atraso na concessão de patentes pela instituição. Do lado oposto às dificuldades, Pimentel, que completa dois anos no cargo em junho deste ano, comemora vitórias pontuais decisivas. Entre elas destaca-se o acordo assinado no último dia 12 de abril com a Anvisa, que resolve o impasse sobre a anuência prévia da Agência nos pedidos de patentes de produtos e processos farmacêuticos. Outra vitória foi a recente entrada da terceira turma de examinadores (num total de 210 novos examinadores, entre 140 aprovados em concurso público e 70 oriundos do cadastro de reserva), permitindo, assim, que a autarquia aproxime-se da ordem de 65% do quadro ideal de servidores do órgão.

A solução final para o problema do ‘backlog’, ou estoque de pedidos à espera de definições técnicas, também continua desafiando a imaginação e esforços físicos do presidente da instituição. Mas, para enfrentar essa dura batalha Pimentel lança mão de armas pessoais – tem vasta experiência na área de direito e políticas públicas, em transferência de tecnologia, em propriedade industrial e inovação, com ampla produção acadêmica neste campo. Pimentel também é professor da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e docente da Academia de Propriedade Intelectual, Inovação e Desenvolvimento do próprio INPI, além de árbitro Ad Hoc do Tribunal Arbitral do Mercosul. Acompanhe, a seguir, a entrevista concedida por Luiz Otávio Pimentel à Revista Máquinas & Equipamentos, da ABIMAQ.

Revista Máquinas & Equipamentos – Inicialmente, qual o seu sentimento quando recebe os dados oficiais da OMPI e verifica que o Brasil ocupa os últimos lugares do ranking global sobre pedidos de patentes? Qual a explicação mais clara para as constantes quedas do Brasil nesse ranking?
Luiz Otávio Pimentel –
O Brasil não está nos últimos lugares do ranking global de pedidos de patentes. De acordo com dados oficiais da OMPI, disponíveis no centro de estatísticas da entidade na internet, ao realizar um ranking global de pedidos de patentes por escritório nacional, ou regional, o Brasil está em 11º lugar, com cerca de 30 mil pedidos por ano, num ranking com 121 países/regiões. Estes dados se referem a 2015. Apesar disso, o Brasil ainda tem grande potencial para crescer neste ranking e ampliar a proteção às criações industriais, de modo a estimular os investimentos em inovação e garantir segurança jurídica a quem investe em pesquisa e desenvolvimento no país. Este potencial pode e deve ser explorado para incentivar o desenvolvimento nacional.

M&E – Quanto custa ao País não proteger seus ‘inventos’ hoje em dia? Ou seja, haveria a possibilidade de revelarmos um ‘valor’ (hipotético que fosse) de quanto o Brasil perde, ou, deixa de ganhar anualmente por não registrar suas patentes? Haveria a possibilidade de decompor esse ‘valor’ por área de atividade econômica no Brasil?
LOP –
Não é possível estimar um valor perdido, até porque sem a exclusividade garantida pela patente, fica difícil mensurar o valor das tecnologias, já que todas as empresas podem usá-la livremente nos países em que ela não está protegida. Mas, certamente, o inverso poderia ser verificado em alguns anos. Se o Brasil expandisse o número de tecnologias protegidas por patentes, o valor a ser ganho pelo país seria bastante expressivo.

M&E – Qual a estratégia adotada pelo INPI no sentido de reduzir o ‘backlog’, ou prazo de análises de patentes?
LOP –
A redução do ‘backlog’ passa por quatro eixos principais, que incluem ações como: a otimização dos processos de exame e aumento da produtividade; recomposição do quadro de pessoal do INPI; expandir os acordos de cooperação internacional em exame de patentes; e fortalecer a infraestrutura de TI do Instituto, visando à automação e acesso ao seu banco de dados.

M&E – Existe a possibilidade de o INPI recorrer a terceiros para reduzir esse tempo de ‘backlog’?
LOP –
Esta possibilidade está em análise. Vamos avaliar a experiência de outros países no uso de especialistas externos e pesquisadores para subsidiar o trabalho do examinador de patente.

M&E – Qual o efetivo atual de examinadores do INPI e qual seria o número ideal a ser alcançado pela autarquia (e em qual cronograma)? Qual a produtividade de cada examinador no momento e o ideal previsto pelo INPI?
LOP –
O INPI tem cerca de 350 examinadores de patentes, sendo que 150 estão em treinamento porque foram nomeados recentemente, enquanto o quadro máximo de examinadores permitido é de 810 profissionais. A produtividade cresceu de forma substancial, passando de 45 para 55 decisões técnicas por pesquisador a cada ano, entre 2016 e 2017.

M&E – Como o INPI projeta completar seu quadro de examinadores visando colocar o órgão em padrões de atendimento mais imediatos e semelhantes aos praticados no exterior?
LOP –
O INPI já solicitou ao Governo Federal a autorização para realizar um novo concurso e ampliar seu quadro de examinadores, de modo a combater o backlog e contar com um número de servidores suficiente para atender à demanda corrente.

M&E – Nesse sentido, como a autarquia opera com a redução de seu orçamento, embutida nos esforços do governo federal para reduzir os gastos públicos?
LOP
– O investimento na contratação de examinadores para o INPI é sustentável do ponto de vista orçamentário, já que eles tomam decisões sobre patentes que geram recursos para o orçamento do Instituto: a partir de uma concessão de patente, por exemplo, é preciso pagar uma taxa para a expedição da carta-patente e uma anuidade para a manutenção.

M&E – Quais os acordos vigentes de Patent Prosecution Highway (PPH) firmados pelo INPI e suas vantagens mais imediatas?
LOP –
O Brasil já tem acordos do tipo PPH vigentes com os Estados Unidos e com o Japão. Também estão em discussão os moldes desta cooperação com o Escritório Europeu de Patentes e logo entrará em vigor o acordo assinado com os países sulamericanos que integram o Prosur. A principal vantagem do PPH é permitir que o exame da patente num país seja acelerado a partir da análise já realizada em outro país. Isso porque, para apurar se uma patente preenche requisitos como novidade e atividade inventiva, é preciso fazer uma busca no mundo inteiro. Portanto, o trabalho é semelhante para todos os examinadores em qualquer país, o que explica tal modelo de cooperação. No entanto, é preciso ressaltar que o examinador brasileiro mantém a autonomia, considerando a legislação brasileira, para conceder ou não a patente.

M&E – Quais os próximos passos no sentido de fechamento de novos PPH?
LOP –
O Brasil recebeu proposta da China, que está em análise.

M&E – Em que consiste o “Exame Prioritário” e em quanto tempo pode reduzir o tempo médio de espera para obtenção de patente?
LOP
– Os pedidos de patentes podem ser examinados com prioridade em determinadas situações. Com o intuito de acelerar o exame em áreas estratégicas para o País, existem projetos piloto de priorização, como tecnologias verdes, produtos para saúde, patentes de micro e pequenas empresas, pedidos de brasileiros que vão para o exterior e o Patent Prosecution Highway (PPH), que consiste num modelo de parcerias bilaterais nas quais os pedidos já examinados num país ganham prioridade no outro. Estes projetos agilizam significativamente o tempo de processamento dos pedidos no INPI. A partir da entrada no projeto prioritário, um destes pedidos de patente pode ser analisado em menos de 1 ano.

M&E – Ao todo são sete os ‘exames prioritários’ criados pelo INPI. Quando foram criados, como funcionam na prática, quais os resultados alcançados e quanto já representam (em %) no conjunto de pedidos concedidos pelo instituto?
LOP –
O exame prioritário mais antigo é o de patentes verdes, que teve grande êxito e se tornou um serviço permanente em dezembro do ano passado. Desde 2016, outros projetos foram iniciados, como o das pequenas empresas e o PPH. O próximo projeto de priorização a ser iniciado é voltado para as instituições de ciência e tecnologia, que começa em 22 de junho. Os projetos apresentam números de pedidos limitados e prazos determinados, pois ainda estão em fase piloto. Porém, pode-se dizer que estes têm sido ferramentas fundamentais para setores econômicos estratégicos, que precisam de respostas rápidas do INPI.

M&E – Em passado não muito remoto, os chamados ‘tigres asiáticos’ praticavam de forma contundente a chamada “engenharia reversa”, ou, cópia pura e simples de produtos e tecnologias desenvolvidas no exterior. Essa prática, inclusive, foi alicerce para que atingissem elevados patamares de desenvolvimento tecnológico junto ao mercado global. De um tempo para cá, percebe-se o crescimento, também rápido e forte, de pedidos de patentes dessas mesmas nações (Japão, China, Coreia do Sul, Taiwan, Malásia, Indonésia). O que aconteceu? Como o senhor justifica essa mudança de procedimento?
LOP –
À medida que os países asiáticos adquiriram conhecimento e conquistaram a capacidade de gerar inovação e competir em escala global, a propriedade industrial se tornou cada vez mais importante para que estes países pudessem garantir retorno para quem investe em inovação. O estímulo à inovação também é uma prioridade para o Brasil, e o INPI faz parte deste esforço.

M&E – Parece questão inexplicável. O Brasil é a oitava/nona economia internacional, entretanto e ao mesmo tempo, é considerado um dos países que menos investe em educação formal, em formação acadêmica e, por consequência, em pós-graduação, mestrado, doutorado e, ao final, em inovação tecnológica, que reflete o estágio de desenvolvimento das nações. Como explicar esse paradoxo e quais os passos mais emergenciais como solução para reduzir o ‘gap’ tecnológico em que o País está mergulhado? A continuar nesse ritmo, num prazo não muito distante seremos apenas e tão somente exportadores de commodities e importadores de tecnologias.
LOP –
Nossa visão é mais otimista. O Brasil tem uma economia forte, com uma indústria muito relevante, que pode ser altamente beneficiada caso aumente a formação de pessoal apto a impulsionar o processo de inovação. O Governo está trabalhando intensamente neste objetivo e, sem dúvida, o resultado será um incremento substancial na inovação gerada no Brasil e nos investimentos em pesquisa e desenvolvimento no país. Para isso, é preciso ter um ambiente de negócios favorável à inovação, o que só poderá acontecer com o fortalecimento do INPI e do sistema de Propriedade Industrial no Brasil.